Uma carta à Kim Kardashian, assinada por uma mulher com celulite | A letter to Kim Kardashian signed by someone that also has cellulite

Tuesday, May 16, 2017

(Sim, faço mesmo questão que me olhem ali para a coxa que está a encostar no chão. Foi por aqueles buraquinhos que eu escolhi esta fotografia para abrir esta carta. | Yes, I really want you to look at my thigh that is close to the floor. I chose this foto exactly because of those little holes.)

Querida Kim Kardashian,

Escrevo para dizer que adoro a tua celulite, o teu rabo. Não adoro todas as coisas pelas quais és tantas vezes chamada de perfeita ou de ícone – os teus lábios, a tua pele, as tuas mamas – adoro mesmo é a tua celulite e o facto de a mostrares mesmo sabendo que há sempre uma câmara apontada a ti e um povo sempre pronto a julgar.

Adoro a tua celulite porque a tua celulite é a minha celulite. A tua vontade de vestir umas cuecas reduzidas mesmo sem ter o rabo “perfeito” (alguém tem?) é, de facto, a minha vontade de vestir umas cuecas reduzidas com o meu rabo também “imperfeito”. A diferença é que, que eu saiba, não anda para aí gente a fotografar-me. Que sorte que eu tenho! A tua celulite é também a celulite da minha irmã, da minha mãe, das minhas amigas, da minha prima, da minha tia, das mulheres que eu mais gosto e que têm celulite, têm estrias, têm pneus, têm pelinhos. A tua celulite é a celulite da maioria, senão de todas as mulheres que vivem neste mundo e que fazem dele um lugar melhor para se viver. A tua celulite fotografada por um e criticada por tantos não é, na verdade, só uma questão de celulite. É uma questão de liberdade. Sim, liberdade. É a liberdade de termos o corpo que temos e de não termos vergonha dele. É a liberdade de escolher as cuecas que queremos usar. É a liberdade de ser mãe de um, de dois, de três e de não sentir necessidade de esconder as marcas de ter passado por essa experiência. É a liberdade de fazermos com o nosso corpo exatamente aquilo que queremos porque, afinal de contas, o nosso corpo é o nosso património, aquele que independentemente do que aconteça, há-de sempre pertencer-nos. É a liberdade de não querermos saber do que o mundo vai pensar. É a liberdade de nos querermos sentir sensuais, confortáveis e felizes. É a liberdade de viver sem pressões e, oh, é tão boa essa liberdade. 

Obrigada Kim, obrigada pela tua celulite. Porque independentemente de gostares dela ou não, não tens vergonha de a mostrar. Claro, claro que todas nós gostávamos de ter um rabo musculado e de pele lisa, de preferência sem pelinhos e outras coisas chatas. E quem diz um rabo, diz umas pernas ou uma barriga. Mas, não tendo, devemos ter vergonha dele? E porquê? Pelo que os outros vão pensar? Era só o que me faltava. O MEU rabo é MEU e ainda faço com ele aquilo que eu quiser. E eu, com celulite e com estrias no MEU rabo, quero passeá-lo pela praia com as cuecas que eu quiser, sem me preocupar com o que as pessoas estão a pensar dele. Quero ser mãe, ver acontecer, eventualmente, todas as alterações físicas que a experiência me irá trazer e continuar a não querer esconder o rabo, a barriga, as pernas, os braços. Porque, foda-se, é ou não é o MEU rabo, a MINHA barriga, as MINHAS pernas, os MEUS braços??

Opiniões, pessoas, toda a gente tem. Eu também as tenho, e também tenho uma opinião sobre o rabo da Kim. Mas não ando por aí a tentar chegar a essas pessoas para transmitir a minha opinião sem que elas me perguntem. “Se não tens palavras simpáticas para dizer, não devias dizer nada”, dizem os Maccabees em No Kind Words, e dizem tão bem!

Por isso mesmo, Kim, obrigada pela tua celulite. Obrigada por não a esconderes e por mostrares mais do que a cintura perfeita, os lábios bonitos, as pestanas longas, o cabelo penteado. O mundo era um lugar melhor se a celulite fosse apenas a celulite.
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Dear Kim Kardashian,

I write to say that I love your cellulite, your tail. I do not love all the things that you are so often called perfect or icon - your lips, your skin, your breasts - I really love is your cellulite and the fact that you show it even knowing that there is always a camera pointed at You and a people always ready to judge.

I love your cellulite because your cellulite is my cellulite. Does your willingness to wear small underwear even without the "perfect" tail (does anyone have it?) Is, in fact, my willingness to wear small underwear with my "imperfect" tail. The difference is that, as far as I know, people are not going to photograph me. How lucky I am! Your cellulite is also the cellulite of my sister, my mother, my friends, my cousin, my aunt, women that I like and have cellulite, have stretch marks, have tires, have hair. Your cellulite is the cellulite of most, if not all the women who live in this world and that make it a better place to live. Your cellulite photographed by one and criticized by so many is not, in fact, just a matter of cellulite. It's a matter of freedom. Yes, freedom. It is the freedom to have the body that we have and not to be ashamed of it. It is the freedom to choose the briefs we want to wear. It is the freedom to be the mother of one, of two, of three and of not feeling the need to hide the marks of having passed through this experience. It is the freedom to do with our body exactly what we want because, after all, our body is our heritage, that regardless of what happens, it will always belong to us. It is the freedom of not wanting to know what the world will think. It is the freedom to want to feel sensual, comfortable and happy. It is the freedom to live without pressure, and oh, that freedom is so good.

Thank you Kim, thank you for your cellulite. Because regardless of whether you like her or not, you're not ashamed to show it. Of course, of course we all liked to have a muscled, smooth-skinned tail, preferably without hairy and other boring things. And who says a tail, says a leg or a belly. But not having, should we be ashamed of it? It's because? What will others think? It was all I needed. MY butt is MINE and I still do with it whatever I want. And I, with cellulite and stretch marks in MY butt, I want to walk him along the beach in my underwear, without worrying about what people are thinking of him. I want to be a mother, to see eventually happen all the physical changes that the experience will bring me and continue not to want to hide the tail, the belly, the legs, the arms. Why, fuck, is or is not MY butt, MY belly, MY legs, MY arms ??

Opinions, people, everyone has. I have them too, and I also have an opinion about Kim's ass. But I do not go around trying to reach out to these people to convey my opinion without being asked. "If you’ve got no kind words to say, you should say nothing more at all," say Maccabees in No Kind Words, and it’s so right.

That's why, Kim, thank you for your cellulite. Thank you for not hiding it and for showing more than the perfect waist, beautiful lips, long eyelashes, hair combed. The world was a better place if cellulite was just cellulite.


Ps.: Diz que a senhora, por causa destas fotografias, perdeu em três dias 100 000 seguidores no instagram. Pensem o que quiserem. | Ps.: Rumor say that, because of these photos, this lady lost 100 000 instagram followers. I leave you thinking whatever you wanna think about this. 


love,
C.

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